Quatro palavras do Novo Testamento que
significam pregar.
O Novo
Testamento descreve a pregação usando mais de sessenta maneiras diferentes,
porém reserva um lugar especial para quatro palavras. Ao escrever sobre elas,
usarei a sua forma verbal, mas terei em mente outras palavras da mesma família.
Por exemplo, quando uso kerusso (“pregar”), também tenho em mente kerygma (“a
mensagem pregada”) e keryx (“um arauto”). Portanto, consideremos estas quatro
palavras e vejamos de que forma elas nos ajudam a compreender o que é pregação.
Talvez alguns de nós devamos nos preparar para uma surpresa!
(1) kerusso
Nenhuma outra
palavra que significa pregar é mais importante do que esta. Ela sempre nos
ocorre quando falamos sobre pregação. É usada mais de sessenta vezes no Novo
Testamento. Significa “declarar, como o faz um arauto”. Refere-se à mensagem de
um rei. Quando um soberano tinha uma mensagem para seus súditos, ele a
entregava aos arautos. Estes a transmitiam às pessoas sem mudá-la ou
corrigi-la. Simplesmente transmitiam a mensagem que lhes havia sido entregue.
Os ouvintes sabiam que estavam recebendo uma proclamação oficial.
O Novo
Testamento usa este verbo para enfatizar que o pregador não deve anunciar sua
própria mensagem. Ele fala como porta-voz de Outrem. A ênfase desta palavra
está na transmissão exata da mensagem. O pregador não fala com sua própria
autoridade. Ele foi enviado e fala com a autoridade daquele que o enviou.
Palavras da família de kerusso são usadas para descrever a pregação de Jonas
(Mt 12.41), de João Batista (Mt 3.1), de nosso Senhor Jesus Cristo (“proclamar”
e “apregoar” — Lc 4.18b-19) e de seus apóstolos (“pregador” — 1 Tm 2.7; 2 Tm
1.11).
(2) euangelizo
Esta é a
palavra da qual obtivemos a nossa palavra “evangelizar”. O verbo grego significa
“trazer boas notícias” ou “anunciar boas-novas”. Em Lucas 2.10, onde lemos que
o anjo disse: “Eis aqui vos trago boa-nova...”, ele usou este verbo. Mas é
importante observar que kerusso e euangelizo não significam algo totalmente
diferente. Muitas pessoas abraçaram a ideia de que esses verbos falam sobre
duas atividades separadas. Apegaram-se a esta ideia sem estudar as Escrituras,
para saber o que elas dizem a respeito do assunto. Assim, desenvolveram pontos
de vista errados quanto à pregação.
Precisamos
considerar com atenção Lucas 4.18-19. Estes versículos descrevem nosso Senhor
falando na sinagoga de Nazaré, a cidade da Galiléia na qual Ele fora criado.
Nosso Senhor começou a sua mensagem lendo o profeta Isaías. Ele escolheu uma
passagem que, centenas de anos antes, predissera o seu ministério. Não há
dúvida de que sua leitura ocorreu em língua hebraica, mas Lucas narrou o
acontecimento usando a língua grega.No versículo 18a, “evangelizar” é uma forma
do verbo euangelizo, enquanto nos versículos 18b e 19, “proclamar e anunciar”
são formas do verbo kerusso. Nosso Senhor usou ambos os verbos para descrever
seu ministério. Ao fazer um, Ele fazia também o outro. “Proclamar” é
“evangelizar”, que, por sua vez, é “proclamar”!
“Evangelizar”
pode até ser usado em referência a algo que fazemos aos crentes! Isto pode ser
visto, por exemplo, em Romanos 1.15. Depois de saudar os seus leitores, que
eram crentes, no versículo 7, e de apresentar as informações dos versículos
8-14, Paulo continuou: “Quanto está em mim, estou pronto a anunciar o evangelho
também a vós outros que estais em Roma”. A expressão “anunciar o evangelho” é
uma tradução do verbo euangelizo. Paulo iria a Roma para evangelizar aqueles
que já eram convertidos! É tempo de pensarmos novamente a respeito de como
usamos nossas várias palavras que expressam a ideia de pregar.
3) martureo
Este verbo
significa “dar testemunho dos fatos”. Hoje, porém, quando os crentes falam
sobre testemunhar, o que eles geralmente querem dizer? Com frequência, usam
esta palavra a fim de descrever aqueles momentos em que contam aos outros sua
experiência pessoal com o Senhor. Na Bíblia, martureo não é usado dessa
maneira, em nenhuma ocasião. Muito frequentemente, esse verbo é usado ao dar
testemunho no tribunal. Em outras ocasiões, martureo é usado com o sentido de
invocar a Deus (ou mesmo pedras) para testemunhar algo. Esse verbo se refere
completamente à objetividade, e não à subjetividade; refere-se a contar às
pessoas fatos e acontecimentos, e não os meus sentimentos ou o que aconteceu a
mim.
Quem já tomou
tempo para estudar a Septuaginta (a antiga tradução grega do Antigo Testamento)
sabe que as afirmações do parágrafo anterior são verdadeiras. Um estudo do Novo
Testamento nos leva rapidamente à mesma conclusão. No relato de João, quando a
mulher samaritana usou martureo (“anunciara” — Jo 4.39), ela se referiu ao
conteúdo de uma conversa. Em 1 João 1.2, quando o apóstolo empregou martureo
(“damos testemunho”), ele falava do que vira e ouvira. Em Atos 26.5, quando
Paulo usou martureo (“testemunhar”), ele o fez porque estava apelando a um
testemunho diante de uma corte.
Mas, ao
estudarmos esta palavra, existe uma passagem que é sobremodo relevante. A
passagem é Lucas 24.44-48. Nestes versículos, nosso Senhor ressuscitado está dizendo
aos discípulos o que deveriam fazer. Deveriam sair por todo o mundo pregando
(kerusso) o arrependimento e a remissão dos pecados (v. 47 — “pregasse”) e
sendo testemunhas (uma palavra da família de martureo) dos grandes fatos do
evangelho, que eles mesmos presenciaram (v. 48). Aqueles que proclamam dão
testemunho; e aqueles que dão testemunho proclamam. E, se olhássemos Mateus
28.20, perceberíamos que os receptores da Grande Comissão também deveriam
ensinar (didasko).
A que
conclusão chegamos? Aprendemos que kerusso não é algo separado de euangelizo.
Também aprendemos que kerusso não é algo separado de martureo. E agora temos
aprendido que kerusso e martureo não são atividades divorciadas de didasko —
nossa quarta grande palavra — à qual nos volveremos em seguida.
Por favor,
observe: não estou dizendo que estas palavras são intercambiáveis. Estou
mostrando que, ao fazermos algumas destas coisas, fazemos também as outras —
visto que pregar inclui todas elas! Este é um argumento que não podemos
enfatizar demais. Adiante, ressaltaremos novamente este argumento. Por
enquanto, devemos considerar nossa quarta palavra.
4) didasko
Esta palavra
significa “pronunciar em termos concretos o que a mensagem significa em
referência ao viver”. É um erro grave separar kerygma (uma palavra da família
de kerusso) de didache (uma palavra da família de disdasko). Não são apenas os
teólogos eruditos que têm procurado fazer isso, pois há inúmeros crentes, em
nossas igrejas, que fazem uma clara distinção entre uma “mensagem evangelística”
e uma “mensagem doutrinária”. Logo falaremos um pouco mais sobre isso.
“Pronunciar em
termos concretos o que a mensagem significa em referência ao viver” não deve
ser um mero acréscimo à nossa pregação; deve ser uma parte da mensagem que
proclamamos. Isto pode ser comprovado ao lermos Atos dos Apóstolos. Em Atos
5.42, lemos que os apóstolos não cessavam “de ensinar e de pregar” (didasko e
euangelizo) a Jesus, o Cristo. Em Atos 15.35, lemos que Paulo e Barnabé
demoraram-se em Antioquia, “ensinando e pregando” (didasko e euangelizo), a
palavra do Senhor. Em Atos 28.31, lemos que Paulo usou sua casa em Roma para
pregar e ensinar (kerusso e didasko). Precisamos ser sensíveis ao vocabulário
do relato inspirado. Quando alguém faz o que significa um desses verbos, essa
pessoa está fazendo, ao mesmo tempo, o que significa algum outro deles!
Precisamos
dizer mais do que isso. Se compararmos Atos 19.13 com Atos 19.8, veremos que
Paulo, ao pregar (kerusso) em Éfeso, também “falava ousadamente, dissertando e
persuadindo”. Desta maneira, Lucas nos mostra que, quando alguém prega
(kerusso), está fazendo muito mais do que os outros três verbos expressam.
Seguir esta linha de pensamento nos levaria a um estudo que vai além do escopo
deste livro. Mas, antes de deixarmos Atos dos Apóstolos, devemos observar Atos
20.24-25. Nesta passagem, Paulo explicou aos presbíteros de Éfeso que dar
testemunho solene do evangelho (“testemunhar” — uma palavra da família de
martureo) foi algo que ocorreu enquanto ele esteve “pregando” (kerusso).
O que isto significa para nós
Estamos em
perigo de dar muita atenção aos detalhes e não entender o que é realmente
importante. Que argumento estamos, de fato, procurando estabelecer? É este:
quando alguém prega, não importa o lugar em que esteja ou para quem está
falando, está fazendo todas as quatro coisas que mencionamos. No Novo
Testamento, não temos uma palavra que signifique pregar para o perdido e outra
que signifique pregar para o salvo. Simplesmente não encontramos mensagens
conhecidas como “mensagens doutrinárias”, enquanto outras são conhecidas como
“mensagens evangelísticas”. Alguns leitores podem achar isto desagradável, mas
não podemos alterar o que a Bíblia diz. A pregação, toda a pregação, envolve
fazer quatro coisas de uma vez.
Se pudermos
entender isso, muitas passagens das Escrituras nos atingirão de maneira
diferente. Um bom exemplo é 2 Timóteo 4.1-5. Nestes versículos, Paulo escreveu
suas palavras finais a alguém que, mesmo sendo jovem, já era um importante
líder cristão. Paulo o instrui solenemente a pregar “a Palavra”! Nesse ponto,
ele usou o verbo kerusso. Mas, por que Timóteo devia fazer isso? Por que viria
o tempo em que as pessoas não suportariam a sã “doutrina” (uma palavra da
família de didasko) e se cercariam de “mestres” (outra palavra da família de
didasko). É óbvio que Paulo estava dizendo a Timóteo que pregar (kerusso) é a
maneira de ensinar (didasko) a igreja e protegê-la do erro.
Mas isso não é
tudo. Paulo exortou Timóteo a fazer o trabalho de um “evangelista” (uma palavra
da família de euangelizo). É claro que Paulo queria dizer que, à medida que
Timóteo pregasse (kerusso) e, consequentemente, ensinasse [didasko], deveria
assegurar-se de que o verdadeiro evangelho (euangelizo) fosse mantido em
primeiro plano. Assim, em um único parágrafo, vemos que três de nossas quatro
palavras foram usadas para descrever a tarefa de Timóteo. Se ele era um
verdadeiro pregador, não faria apenas uma dessas coisas e sim todas elas. Onde
quer que encontremos a verdadeira pregação, várias coisas acontecem ao mesmo
tempo.
Se não
levarmos isso em conta, jamais seremos verdadeiros pregadores. Temos de nos
livrar da ideia de que existem dois tipos de pregação: uma que é adequada ao
não convertido e outra que é conveniente para o convertido. De agora em diante,
temos de rejeitar o pensamento de que pregar para o perdido e pregar para o
salvo são dois fenômenos distintos. Não devemos estabelecer uma divisão entre
um tipo e outro de pregação. Toda pregação é uma proclamação da salvação (no
pleno sentido desse termo) a homens e mulheres, rapazes e moças. É verdade que
a audiência pode ser constituída de pessoas muito diferentes. É verdade que os
não convertidos e os convertidos não têm as mesmas necessidades. Portanto, é
verdade que a maneira como a Bíblia é aplicada pode variar consideravelmente.
Mas não é verdade que a pregação ministrada aos não convertidos possui uma
natureza diferente da pregação apresentada aos convertidos. A ideia de que há
dois tipos distintos de pregação (e de que algumas pessoas são boas para um
tipo de pregação; e outras pessoas são boas para outro tipo de pregação) está
impedindo as pessoas de todos os lugares a entenderem o que é a verdadeira
pregação.
Fonte: Livro Pregação Pura e Simples; Autor: Stuart Olyott; pg. 13-19. Editora Fiel.
Por: Andrezinho Rupereta.
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