Frequentemente
recorrem-se à posição do célebre C. H. Spurgeon. Ele fez fortes declarações
sobre a soberania de Deus. Mas aqueles que param por aqui não tratam Spurgeon
adequadamente. Para ser sincero, ele enfatizava a soberania divina, todavia
esse não é o único lado de Spurgeon. Um estudo de suas obras mostra que ele
vigorosamente exibia o outro lado também.
Esta é também a observação de alguns que
conheceram bem Spurgeon. O Dr. Arthur T. Pierson foi convocado para suceder
imediatamente o ministério de Spurgeon no Metropolitan Tabernacle em Londres,
onde ele exerceu por vários anos. Ele deve, por essa razão, ter tido
conhecimento real e entendimento da posição de Spurgeon. Ele reconheceu
claramente os dois lados da visão de Spurgeon:
"A
soberania divina e a liberdade humana são alternadamente enfatizadas na
Escritura, e nenhuma tentativa é feita para harmonizá-las. A falha de todos os
sistemas teológicos é que eles tentam uma harmonia e um ajuste científico do
que a Palavra de Deus deixa um problema não resolvido e um paradoxo insolúvel.
C. H. Spurgeon não tinha sido há muito um pregador e pastor antes que ele
também estivesse contente por insistir na eleição soberana de Deus e na eleição
voluntária do homem de Deus, como ambas verdadeiras e essenciais à salvação.
Mas ele não fez mais tentativa para harmonizá-las do que Cristo antes dele,
quando Ele disse quase com a mesma expressão, 'Ninguém pode vir a mim, se o Pai
que me enviou o não trouxer,' e novamente, 'Não quereis vir a mim.'"
(Pierson, A. T.: Seed Thoughts For Public Speakers, p. 271)
O Dr. A. H. Strong em sua Systematic Theology
(p. 364), ao chegar no problema de equilibrar o lado divino reconhecendo também
o lado humano, referiu, entre outros, ao livro The Best Bread (p. 109) de C. H.
Spurgeon em um sermão sobre a crucificação:
"O
quaterno de soldados fizeram tudo que queriam fazer. Eles agiram de seu próprio
livre-arbítrio, e todavia cumpriram o eterno conselho de Deus. Nunca seremos
capazes de fincar nas mentes dos homens a verdade que a predestinação e a
livre-agência são ambos fatos? Os homens pecam tão livremente quanto pássaros
voam no ar, e eles são completamente responsáveis por seu pecado; e todavia
tudo é ordenado e previsto por Deus. A preordenação de Deus em nenhum grau
interfere na responsabilidade do homem. Geralmente as pessoas me pedem para
reconciliar as duas verdades. Minha única resposta é – Elas não precisam ser
reconciliadas, pois elas nunca se separaram. Por que eu devo tentar reconciliar
dois amigos? Prove para mim que as duas verdades não concordam. Estes dois
fatos são linhas paralelas; eu não posso uni-las, mas você não pode fazê-las
cruzarem. Permita-me também acrescentar que eu há muito abandonei a idéia de
dispor todas as minhas crenças em um sistema. Eu acredito, mas não posso
explicar. Me prosto ante a majestade da revelação e adoro o infinito
Senhor."
Spurgeon se expressou um tanto similarmente em outro
sermão:
"'Todo
o que o Pai me dá virá a mim; e o que vem a mim de maneira nenhuma o lançarei
fora' (Jo 6.37). Estas duas sentenças têm sido consideradas como representando
os dois lados da doutrina cristã. Elas nos possibilitam vê-la de dois pontos de
vista – de Deus e do homem.... A segunda sentença mostra a abençoada,
encorajadora, doutrina evangélica, e é de fato uma promessa e um convite – 'O que
vem a mim de maneira nenhuma o lançarei fora.' Esta é uma afirmação sem
qualquer limitação: pensa-se que ela deixa a livre graça de Deus aberta ao
livre-arbítrio do homem, para que quem quiser possa vir e estar seguro de que
não será recusado. Não temos permissão para restringir qualquer uma das
sentenças, nem há a menor necessidade de assim fazer.... Estas são duas grandes
verdades; vamos carregá-las ambas conosco, e elas se equilibrarão. Me pediram
uma vez para reconciliar estas duas afirmações, e eu respondi, 'Não, eu nunca
reconcilio amigos.'... A grande declaração do propósito de Deus que Ele salvará
os Seus é totalmente consistente com a maior declaração de que quem vir a
Cristo será salvo. É uma pena que sempre se considerou difícil sustentar ambas
as verdades.... Tomem, então, estas duas verdades, e saibam que elas são
igualmente preciosas porções de um todo harmonioso." (The Treasury of the
New Testament, Vol. II, p. 355)
Novamente, enquanto ainda gloriando no lado
divino ao qual ele dá espaço completo, Spurgeon reconheceu o lado humano, mesmo
com suas limitações:
"Essa
é a verdade, sobre a qual, espero, nunca tenhamos qualquer dúvida; sustentamos
tenazmente que a salvação é toda da graça, mas também cremos com igual firmeza
que a ruína do homem é inteiramente o resultado de seu próprio pecado. É a
vontade de Deus que salva; é a vontade do homem que condena.... Há grandes
abismos sobre estes dois pontos. A parte prática da teologia é o que é mais
importante que entendamos. Pode entrar num labirinto terrível aquele que pensa
continuamente na soberania de Deus somente, e pode igualmente cair em
profundezas que devem provavelmente sufocá-lo se ele meditar apenas no
livre-arbítrio do homem. A melhor coisa é aceitar o que Deus revela a você, e
crer que... O que se espera é, primeiro, uma verdadeira vontade para vir para
Deus. Você ouviu muito, atrevo-me a dizer, sobre a maravilhosa faculdade do
livre-arbítrio.... Aí está onde o pecador falha, o que ele precisa é de uma
vontade verdadeira.... Não há nenhuma disposição em seus corações, pois uma
disposição verdadeira é uma disposição prática. O homem que deseja vir a Cristo
diz, 'Devo livrar-me de meus pecados, de minha própria justiça, e devo buscar
Aquele que unicamente pode me salvar.'... Há necessidade de uma vontade
urgente. Você está disposto a vir para Cristo agora? Eis a questão.... Então,
vejam, é de uma vontade real e urgente que é preciso." (Treasury of the
New Testament, Vol. I, pp. 340, 342)
Mais uma vez Spurgeon claramente se expressou:
"Vejam
quão docemente a segunda oração de nosso texto coloca – 'Quem quiser, tome de
graça da água da vida.' Se está sedento ou não, todavia tem vontade de beber?
Tem vontade de ser salvo? Vontade de ser feito uma nova criatura em Cristo?
Deseja ter vida eterna? Então assim diz o Espírito a ti, 'Quem quiser, tome de
graça da água da vida.'... 'Quem quer que' – então quem ousaria ter a
impudência de dizer que está excluído? Se disser que você não pode estar dentro
dos 'quem quer que' – isso deve significar todo homem que já viveu, ou irá
viver, enquanto, todavia, ele estiver aqui e deseja vir." (Treasury
of the New Testament, Vol. IV, p. 845)
Sobre outro
assunto Spurgeon disse:
"Você
não confia nele; você não O obedece. Oro para que você considere o fato. 'Posso
crer nele?' diz alguém. Já não dissemos dez mil vezes que quem quiser pode
tomar da água da vida livremente. Se houver alguma barreira não é com Deus, nem
com Cristo, é com seu próprio coração pecaminoso. Você é bem vindo ao Salvador
agora, e se você confiar nele agora Ele é seu para sempre.... Você vira suas
costas para o Deus encarnado que derrama seu sangue pelos homens, e ao fazer
assim você se exclui da esperança, julgando-se indigno da vida eterna.... Há
uma água da vida, mas você se recusa a bebê-la; então você deve ficar sedento
eternamente. Você põe para longe de você, voluntariamente, o único Redentor;
como então você será remido?" (Treasury of the New Testament, Vol. II, pp.
301, 303)
Em um sermão intitulado "Responsabilidade
Humana," Spurgeon disse:
"Tenho
sido muitas vezes repreendido por certos homens que se desviaram da verdade,
por pregar a doutrina que é pecado os homens rejeitarem o evangelho de Cristo.
Não me importo com qualquer título infamante: estou certo de que tenho
permissão da Palavra de Deus para pregar assim, e não acredito que qualquer um
pode ser fiel às almas dos homens e limpos de seu sangue, a menos que carregue
seu testemunho freqüente e solene sobre este assunto vital.... Não fiquei sem
expor as gloriosas doutrinas da graça, ainda que ao pregá-las os inimigos da
cruz me chamaram de antinomiano; nem tenho tido medo de pregar a solene
responsabilidade do homem, ainda que uma outra classe tem me difamado como
arminiano. E ao dizer isto, não o digo a fim de gloriar, mas o digo para sua
repreensão, se você tem rejeitado o evangelho, pois você terá pecado muito
acima de quaisquer outros homens; ao rejeitar Cristo, uma dupla medida da
impetuosidade da ira de Deus cairá sobre você." (Memorial Library, Vol. V,
pp. 426, 429)
Em um sermão sobre o texto , "Força-os a
entrar," Spurgeon disse:
"Eu
seria pior do que um demônio se eu não, com todo amor, e bondade, e zelo,
implorasse para você 'tomar posse da vida eterna.' Alguns hiper-calvinistas me
diriam que estou errado em fazer assim. Não posso deixar de fazer isto. Devo
fazer isso. Como eu devo me apresentar, finalmente, diante de meu Juiz, sinto
que eu não farei completa prova de meu ministério a menos que suplique com
muitas lágrimas que vocês sejam salvos, que vocês olhem para Jesus Cristo e
recebam Sua gloriosa salvação."
No
mesmo sermão, em uma única página de duas colunas, em sua súplica Spurgeon sete
vezes citou versos com "quem" ou "qualquer um" neles;
"'Quem crer,' 'quem invocar,' 'quem vir,' 'quem crer,' 'quem quiser, deixe-o
vir,' 'qualquer um que invocar,' e 'quem quiser.'" (Treasury of the New
Testament, Vol. I, pp. 885, 882)
Em uma outra obra Spurgeon novamente mostra a
liberdade da ação humana:
"A
matéria inanimada obedece à lei divina pela força, mas um ser humano pode
somente obedecer a Deus com sua vontade, visto que obediência relutante não
seria obediência coisa nenhuma. Não pode haver tal coisa como amor relutante,
confiança relutante, ou santidade relutante. A voluntariedade entra na essência
de um ato moral. Tendo, por isso, assim feito o homem, o Senhor não se esquece
desse fato, mas sempre trata o homem como um agente livre. As compulsões
divinas de Sua graça são apenas congruentes com uma criatura disposta e
indisposta." (Illustrations and Meditations, or Flowers From a
Puritan's Garden, p. 124)
De uma fonte diferente vem outra declaração
ainda mais forte de Spurgeon:
"Griffiths
diz que viajantes na Turquia carregam consigo pastilhas de ópio, nas quais está
gravado 'mash Allah,' o dom de Deus. Vários sermões são como tais pastilhas. A
graça é pregada mas o dever negado. A predestinação divina é exaltada mas a
responsabilidade humana é rejeitada. Tal ensino deve ser evitado como venenoso,
mas aqueles que pelo uso cresceram acostumados ao sedativo, condenam toda outra
pregação, e exaltam suas pastilhas de ópio da eminente doutrina como a verdade,
o precioso dom de Deus. Deve ser temido que esta doutrina suco de papoula tem
mandado muitas almas para dormir que acordarão no inferno." (Feathers for
Arrows, p. 65)
Para demonstrar mais completamente a ênfase de
Spurgeon sobre o papel a ser desempenhado pelo homem, seus sermões, como por
exemplo, sobre certos textos nos Evangelhos, podem ser lidos. Com ardorosa
súplica, ele insiste que o evangelho é para todos os homens, incita todos a
procurar refúgio no Salvador, e mostra o perigo pelo qual serão responsáveis se
eles deixarem de agir. Em seu sermão
sobre 1Tm 2.4 ele zomba daqueles que transformariam "quer que todos sejam
salvos" em "alguns homens" ou em "que não quer que todos os
homens sejam salvos."
Sua autobiografia tem algumas coisas
interessantes. Há uma citação de alguém dizendo dele:
"Ele
discorria sobre a 'Responsabilidade Humana.'... Não muito tempo depois ele
demonstra os dois lados da verdade divina em um sermão intitulado 'Graça
Soberana e Responsabilidade do Homem,' em que ele evitava os erros do
Arminianismo por um lado, e os do hiper-Calvinismo por outro." (Autobiography,
Vol. II, p. 224)
Na mesma obra Spurgeon disse dos estudantes que
saíram de seu Pastor's College:
"Alguns
poucos têm passado para o hiper-Calvinismo, e, por outro lado, um ou dois tem
vagueado em sentimentos arminianos; mas mesmo estes têm permanecido zelosamente
evangélicos, enquanto a maior parte dos irmãos continuam na fé em que seu
colégio os educou." O lema do Pastor's College era uma mão segurando a
cruz, a qual estavam acrescentadas as palavras: "Seguro e sou
segurado." (Ibid., p. 150)
Em Spurgeon's Lectures to His Students, editado
por David Otis Fuller, é evidente que Spurgeon falava com força e até com um
pouco de sarcasmo àqueles que estavam indo trabalhar no evangelho. Em um
capítulo intitulado, "Sobre a Conversão Como Nosso Alvo," ele disse:
"Todo
e qualquer apelo que alcançar a consciência e mover os homens a lançarem-se
para Jesus devemos perpetuamente empregar, se por qualquer meio possamos salvar
alguns.... Em nome de nosso Mestre devemos dar o convite, proclamando 'quem
quiser, tome de graça da água da vida.' Não se intimidem, meus irmãos, por
aqueles teólogos ultra-calvinistas que dizem, 'Você pode instruir e alertar os
incrédulos, mas você não deve convidá-los ou suplicar a eles.' E por que não?
'Porque eles são pecadores mortos, e por isso é absurdo convidá-los, visto que
eles não podem vir.' Por que então podemos alertá-los ou instrui-los? O
argumento é tão forte, se é que é forte, que elimina todos os modos de apelo
aos pecadores.... Quem entre os filhos dos homens pensaria que é uma grande
vocação a ser enviada na sinagoga para dizer a um homem perfeitamente vigoroso,
Levanta e anda'? Ele é um pobre Ezequiel cuja maior realização é gritar, 'Vós,
almas vivas, vivam.'" (pp. 327-329)
A consideração da posição de Spurgeon pode bem
ser concluída apresentando o que é relatado por um erudito britânico
completamente versado nesta área:
"Charles
Haddon Spurgeon sempre alegou ser calvinista.... Sua mente estava infiltrada
nos escritos dos teólogos puritanos; mas seu intenso zelo pela conversão das
almas o levou a pisar fora dos limites do credo que ele tinha herdado. Seu
sermão 'Força-os a entrar' foi criticado como arminiano e não ortodoxo. A seus
críticos ele respondeu: 'Meu Mestre colocou Seu selo nessa mensagem. Eu nunca
preguei um sermão pelo qual muitas almas foram ganhas para Deus.... Se
considerarem uma má coisa declarar ao pecador tomar posse da vida eterna,
serei, todavia, pior a este respeito, e nisto imitarei meu Senhor e Seus
apóstolos.'
"Mais
do que uma vez Spurgeon orou 'Senhor, se apresse em trazer Seus eleitos, e
então eleja alguns mais.' Ele parece ter usado esta frase muitas
vezes em conversa, e em seus lábios não era mera pilhéria. Com sua rejeição
definitiva de uma expiação limitada, ela teria horrorizado João Calvino.... A verdade
parece ser que as velhas frases calvinistas estavam com frequência nos lábios
de Spurgeon mas o significado calvinista genuíno tinha saído delas.
"J. C. Carlile admite que 'ilógico como
possa parecer, o Calvinismo de Spurgeon era de tal natureza que, enquanto ele
proclamava a majestade de Deus, ele não hesitava em atribuir liberdade da
vontade ao homem e insistir que qualquer um poderia encontrar em Jesus Cristo
livramento do poder do pecado. '" (Underwood, A. C., A History of the English Baptists, pp.
203-205)
Fonte : ELEIÇÃO E PRESTINAÇÃO. AUTOR: SAMUEL
FISK
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